Etanol: até quando?
Pare para pensar: quantas vezes, nos últimos tempos, você passou num
posto de combustíveis e abasteceu seu carro flex com etanol? Se você
considera apenas o bolso, e é natural que seja assim, é provável que
pouquíssimas vezes não tenha enchido o tanque com gasolina. Não é um
contrassenso num país como o Brasil?
A mais verde e amarela das tecnologias alternativas, muito menos
poluente e danosa ao ambiente e à saúde das pessoas, e uma das mais
eficazes opções à queima do combustível fóssil, vive crise sem
precedentes no país.
Tenho andado muito pelo interior do Brasil e visto de perto o vigor da
nossa agropecuária e a dedicação dos nossos produtores. Por tudo isso, é
contraditória a gravidade da crise por que passa a nossa produção de
álcool.
Nos últimos anos, mais de 40 usinas fecharam. Outras estão em processo
de recuperação judicial ou enfrentam graves dificuldades. Milhares de
pessoas já perderam o emprego.
Trata-se de situação completamente distinta da que se projetava poucos
anos atrás. Até então o Brasil estava fadado a ser a maior potência
mundial de energia renovável.
Caminhávamos para ser a vanguarda da sustentabilidade, exemplo em um
mundo em busca de fontes não fósseis, limpas e mitigadoras do
aquecimento global pela redução das emissões de CO2.
Descarrilamos, contudo.
Não foi obra do acaso. Não foi barbeiragem de produtores, nem
irresponsabilidade de investidores. Não foi mera consequência da mudança
de ventos na economia global.
Foi, isso sim, produto de equívocos cometidos por uma gestão que está
matando o etanol brasileiro. É um estrago de grandes proporções, que se
espalha por longa cadeia de produção que envolve 2,5 milhões de
trabalhadores e centenas de municípios do país.
Sem perspectivas de melhora, as usinas não investem, o mercado não reage
e o Brasil chega ao ponto de importar etanol dos EUA -e com desoneração
tributária concedida pelo governo federal. Como pode?
Os produtores não precisam de muito, mas tem nos faltado o básico. Basta
que o governo não atrapalhe, como tem feito, defina uma política de
longo prazo para o setor energético e reestabeleça condições mínimas de
competitividade: equilíbrio na formação de preços, tributos adequados e
algum amparo na forma de linhas de crédito que realmente funcionem.
Não é algo tão complicado, mas é tudo o que o governo petista não faz.
Há uma crise de confiança instalada no país. As vítimas vão caindo pelo caminho e são cada vez mais numerosas.
É o futuro do Brasil que está sendo sabotado. No caso do etanol, é toda
uma experiência de mais de 40 anos que está sendo jogada no lixo pela
vanguarda do atraso.
AÉCIO NEVES escreve às segundas-feiras na Folha.