É… Como é mesmo que dizia Camões? Lembrei: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,/ Muda-se o ser, muda-se a confiança:/ Todo o mundo é composto de mudança,/ Tomando sempre novas qualidades”. É, PT…! É, Renan Calheiros…! Já não dá mais para fazer do Congresso a casa da mãe joana, a casa da mãe Dilmona ou o fundo do quintal de interesses menores. Ou melhor: até dá! Mas já não é sem protesto. A que me refiro?
Renan teve de suspender nesta terça a sessão destinada a votar o projeto de lei que dá ao governo um cheque em branco para fazer o que bem quiser com a LDO, a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Pouco importa se vai produzir déficit ou superávit. Trata-se de uma agressão ao Artigo 165 da Constituição e, entendo, de uma agressão à Lei 1.079, que define crime de responsabilidade. Como o governo decidiu ir às compras, na sexta, o Diário Oficial da União publicou um decreto em que Dilma amplia o limite de recursos para emendas individuais dos parlamentares em R$ 748 mil por cabeça, mas só se eles aprovarem a LDO. Coisa igual nunca se viu.
As galerias estavam tomadas por manifestantes contrários ao projeto. Uma confusão, digamos sonora, gerou a balbúrdia. Quando a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) discursava, parte das galerias gritava: “Vai pra Cuba!”. Era, claro!, uma referência ao fato de a parlamentar ser membro do PCdoB, um partido alinhado com o regime cubano e que participou ativamente das hostilidades à blogueira Yoani Sánchez, quando esteve no Brasil. Ocorre que a também comunista do Brasil Jandira Feghali, deputada do Rio, entendeu que Vanessa estava sendo chamada da “vagabunda!”. Ela protestou contra a suposta agressão, e Renan, vermelho como uma bacante, mandou a Polícia Legislativa esvaziar as galerias, suspendendo a sessão por um tempo. Depois de muito empurra-empurra, agarra-agarra, cotovelada pra lá e pra cá, envolvendo manifestantes, parlamentares e policiais, não houve jeito. Renan, então, encerrou a sessão e remarcou a próxima para esta quarta, às 10h.
Referindo-se aos manifestantes, o presidente do Senado afirmou: “Essa obstrução é única em 190 anos do Parlamento: 26 pessoas presumivelmente assalariadas obstruindo os trabalhos do Congresso Nacional”. O também senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) emendou: “Todos nós sabemos que é o pessoal que veio trazido pelo deputado Izalci. Todo mundo conhece, todo mundo sabe quem são. Se são pagas ou não, não sei”. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), rebateu: “Isso é uma bobagem, é mais um equívoco. A população brasileira acordou. As pessoas estão participando do que está acontecendo no Brasil. E algumas querem vir [ao Congresso]. Nós vamos fechar as galerias?”.
Renan deveria ter mais respeito com a divergência. Quantas vezes aquelas galerias foram ocupados por manifestantes levados por parlamentares de esquerda, disfarçados de movimentos sociais, para defender isso e aquilo? Quando o presidente do Senado concorda com a gritaria, é um caso de direito à manifestação e, quando ele não concorda, de pressão ilegítima?
Foi patético assistir, por exemplo, ao líder do governo na Câmara, o petista Henrique Fontana (RS), a vituperar contra a presença de manifestantes nas galerias. Aos brados, dizia que o Parlamento estava impedido de trabalhar. Justo ele, um homem do PT, cujo partido se notabilizou por lotar a Casa com os ditos movimentos sociais para impor a sua vontade no berro. Ah, sim: ele também sugeria haver constrangimento ilegal. Nem parecia que Fontana era um dos comandantes da tropa que queria estuprar a Constituição!
Quórum para a votação, bem, este havia. Estavam em plenário 370 deputados e 54 senadores. Para que a votação tivesse prosseguimento eram necessários, respectivamente, 257 e 41 (metade mais um de cada uma das Casas). Sim, meus caros, é bem possível que Constituição e moralidade sejam violadas por um Congresso que, então, perderá um pouco mais do que a independência. Estará entregando também a honra. Por isso, os que não querem se confundir que deixem clara a sua posição.
Por Reinaldo Azevedo
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