Por Geraldo Samor - O Globo
Qualquer leitura crítica do que aconteceu no mercado nesta quinta-feira sugere que a boa vontade dos investidores com o Governo reeleito está prestes a expirar.
O proverbial benefício da dúvida está escoando pelo ralo, na medida em que fica cada vez mais claro que a Presidente reeleita tem um mandato na mão e nada de novo na cabeça.
O Real perdeu 2,5% contra o dólar, e a Bovespa entregou 2%. Somados, esses movimentos significam que um investidor internacional com grana no Brasil perdeu, em apenas um dia, 5% do seu investimento. Melhor fazer as malas.
Nesta semana e meia desde o segundo turno, o mercado ouviu promessas de mudança, circularam nomes respeitáveis para o Ministério da Fazenda, e uma alta de juros inesperada insinuou um clima de seriedade. Em cada fragmento dessa narrativa, e a despeito das preferências pessoais da maioria de seus participantes, o mercado tentou ver a fumacinha branca — aquela que diz não Habemus Papam, mas Habemus Juízo.
Infelizmente, o blá-blá-blá dos sinais foi seguido pelo silêncio.
Ministro da Fazenda? Por que a pressa?
Metas fiscais claras e mais duras? Senta aí, menino.
(Para não dizer que o Governo não anunciou nada, saiu há pouco o aumento da gasolina. Um aumento envergonhado, de 3%, um aumento com medo de provocar o dragão que já cospe fogo no teto da meta. Too little, too late.)
A Presidente age como se a economia estivesse muito bem, obrigado. Como se não precisasse reanimar o espírito animal dos empresários e como se as oscilações do mercado fossem só um jogo sem consequências.
Enquanto a Presidente encenava a peça “Está tudo sob controle”, o Senado aprovou a mudança no índice que corrige as dívidas de Estados e municípios, permitindo que prefeitos e governadores assumam mais dívidas — isso no momento em que o Governo acaba de reportar o pior resultado das contas públicas desde o Plano Real.
Observando (de longe mas com lupa) essa esquizofrenia institucional, os gringos mandaram a ordem — “Venda” — e o dólar no mercado à vista fechou em 2.5699 reais. Guarde essa cotação; você provavelmente ainda vai olhar pra trás e achar isso barato.
O problema com as expectativas é que elas costumam se retroalimentar.
Um dia de baixa nos mercados pode, sim, ser seguido por um dia de alta. Mas se aquilo que a presidente Dilma chama de “pessimismo” (também conhecido como “realismo” por quem sabe fazer contas e as faz com honestidade) se alastrar, vai contaminar ainda mais a economia real,cujos sinais de fraqueza já eram evidentes antes do segundo turno.
A falta de urgência da Presidente Dilma — para usar uma expressão que a candidata adorou usar na campanha — está “no limite da responsabilidade”.
E isto só pode estar acontecendo porque ela não acredita na mensagem dos mercados. Ou porque se recusa a mudar. Ou, pior, porque não tem ideia do que fazer daqui pra frente.
Porque ela acha que preços de mercado não têm nada a ensinar.
Provavelmente, a Presidente vai ter que aprender do jeito mais difícil — e nós, estarrecidos, vamos pagar a conta.
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