Enfim, Dilma venceu as eleições por ligeira margem: 51,63% a 48,37%.
E eu já avisava dias atrás que independentemente dos resultados, estas eleições seriam as mais fascinantes da história da política nacional. Discutiu-se “tecnicamente” o que ocorria nessas eleições muito mais do que no passado. Eu particularmente fui bastante focado neste quesito.
Se nosso nível de conscientização política aumentou, também é fato que vimos o quanto precisamos evoluir no que diz respeito a entender a política como uma guerra. A partir de agora, teremos que ser muito mais incisivos diante de pessoas do nosso lado que se recusem a entender isso.
Se Aécio Neves tivesse sido eleito, seria um mérito dele (especialmente por sua participação nos debates) e de nossa capacidade de apoiá-lo, nas redes sociais. Sua derrota foi mérito de uma campanha política irretocável, do PT, e de uma campanha que se recusou a entender a política como uma guerra, a do PSDB.
Acompanhar o programa eleitoral do PSDB foi uma agonia durante vários dias. Víamos o PT marcando posição atrás de posição e, enquanto isso, do outro lado só omissão.
A derrota não é responsabilidade do povo, mas dos formadores de opinião de cada lado.
A meta agora é atacar a ingenuidade política daqueles que estão ao nosso lado. Chega de infantilidade política diante de oponentes. Chega da arrogância de se recusar a entender a política como uma guerra. Chega de deixarmos de ver a realidade como ela é.
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Repito: a responsabilidade da vitória do PT nesta eleição é da campanha de TV e rádio do PSDB. Além, é claro, da militância virtual, muito mais orientada a pensar em termos de guerra política. Mas quem ditou o tom foi a campanha oficial. Lembremos uma análise que fiz em 10/10, a respeito do horário eleitoral em 09/10:
“Nos quesitos técnicos (de acordo com os paradigmas de guerra política), o programa de Dilma foi um espetáculo. O marqueteiro de Dilma não precisou nem sequer utilizar Lula. Bastou usar símbolos de medo e esperança o tempo todo, intercalando propostas novas com ataques contundentes à Aécio e o PSDB. Em alguns momentos, os ataques vinham sempre em sincronia com símbolos de esperança. Exemplo: “Eu represento X, ele, ao contrário, representa Y; eu fiz Z, ele, ao contrário, fez W”.“Acho que os números são claros. Por uma opção deliberada da campanha do PSDB (que incluiu 2 minutos de musiquinha, lembre-se), foi dado à Dilma um potencial de ataque fabuloso. João Santana pode ser um Goebbels, mas está de parabéns.”“Mas é claro que a falta de ataques é imperdoável. Em um dos aspectos mais importantes da guerra política, simplesmente não foi um bom começo do uso do horário eleitoral.”“Não é motivo para desespero, claro, pois o estado atual das coisas é sinistro para Dilma, com o aumento da inflação e as notícias mostrando as delações premiadas de Youssef e Costa. E mesmo com uma ótima campanha, as notícias da mídia podem ser suficientes para derrubar o PT. Mas um alerta deve ficar claro para a campanha tucana: a campanha de Dilma hoje deu um show de competência.”
E a coisa não melhorou a partir daí. Ao contrário, piorou.
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Como devemos nos sentir em relação à campanha de TV e rádio do PSDB?
Vamos fazer um exercício mental e voltar à era do nazismo, onde temos um partido que defende que os judeus sejam respeitados, lutando contra o partido de Hitler, que quer o preconceito contra os judeus.
Imagine-se em uma reunião de campanha:
X: Hitler está usando discursos cada vez mais fortes, usando divisionismo, apelando ao coração e atacando o tempo todo. Precisamos fazer algo contra isso!
Y: Nós vamos usar musiquinha!
X: Musiquinha? A cada programa de rádio, o Hitler redobra a intensidade, usando a técnica do “shock and awe”, e aumenta nossa rejeição.
Y: Para cada ataque, faremos uma proposta!
X: Mas e os ataques que ele não pára de fazer?
Y: No fim a verdade prevalecerá!
X: Isso é um absurdo! Ele definiu a estratégia de aumentar nossa rejeição, o que vai ajudá-los. A nossa imagem está piorando.
Y: Nós vamos usar musiquinha!
Agora basta visualizar as consequências de alguém se recusando a entender que política é guerra. Neste exemplo, são as afirmações de Y em direção a X.
Como você encararia a postura de Y? A meu ver, isso é crime moral. Y foi a campanha de TV e rádio do PSDB nestas eleições.
No fim das contas, é claro que falamos de uma derrota merecida. Não para Aécio, que foi muito bem nos debates. Não para nós, das redes sociais. Mas um crime moral cometido por quem teve tempo suficiente para jogar a guerra política no horário eleitoral. A prática de um crime moral de tamanha dimensão não poderia ficar impune.
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Mas se a campanha do PSDB foi desastrosa, nós também não devemos sair ilesos de críticas. Precisamos melhorar a forma de a política.
Várias pessoas chegaram em meu inbox durante essas eleições e diziam: “Olha, Luciano, veja o que o PT fez”. Se essas mensagens fossem apenas informativas, tudo bem. (Tive várias dicas de boas postagens dessa forma)
O problema é que as mensagens vinham em tom de espanto e indignação. Em outras palavras, o sujeito está no meio do campo de batalha e se espanta quando o outro lado atira. (Estou sendo metafórico, é claro)
Era assim: “Olha o meme que o PT está usando! Olha o que eles fizeram no programa! Olha o que a Dilma acabou de falar!”. E minha resposta quase sempre era a mesma: “Eles estão fazendo a parte deles.”
O que isso nos mostra? Que agora é a hora de mudarmos nossa estrutura mental. A forma de como reagimos aos estímulos do mundo está errada quando tratamos de questões políticas.
Não podemos mais tolerar a ingenuidade política daqueles que estão ao nosso lado.
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As próximas metas devem ser derrubar o Decreto 8243 e os projetos de censura de mídia do PT.
Mas para isso, será preciso entender que essa eleição demonstra o fim de um ciclo: a derrota moral daqueles que se recusam a entender a política como uma guerra. É preciso, antes de tudo, que essa parcela da oposição entenda o recado das urnas.
Na guerra política, o agressor geralmente prevalece. E a política é uma guerra de posição, onde posições são conquistadas através de símbolos de medo e esperança.
Foi só isso que o PT fez, mentindo à rodo, enquanto a campanha do PSDB se recusou a entender algo tão básico.
O PSDB realmente tinha a verdade em mãos, enquanto o PT mentia. Mas de nada adianta você ter a verdade em mãos se não joga a guerra política.
Ter a verdade em mãos, ao mesmo tempo em que se recusa a jogar a guerra política, também é uma forma de desprezo pela verdade.
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Me perguntaram: “Como você está com isso?”
Bastante chateado por estar certo no que eu havia dito há muito tempo. Vemos um partido, o PT, entendendo a política como uma guerra. Enquanto isso os outros brincando de fazer musiquinha.
Toda a eleição foi uma torcida para que eu estivesse errado. Infelizmente, não estava.
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Observem como Horowitz se sentia na abertura de A Arte da Guerra Política, escrito em 2000:
Durante o debate sobre o impeachment, o povo americano sabia que Bill Clinton era corrupto e o desprezava como pessoa, mesmo que não o quisessem afastado do cargo. A maioria dos americanos sabia que ele era culpado de perjúrio, mas estavam relutantes em vê-lo cassado. Clinton escapou do julgamento porque baseou sua defesa em princípios conservadores, e também porque os republicanos ficaram em silêncio por oito meses decisivos, o que permitiu-lhe definir os termos do debate. Quando os republicanos finalmente encontraram sua voz coletiva, eles ignoraram as preocupações imediatas do eleitorado americano e basearam o seu julgamento em questões que eram demasiadamente complexas para serem digeridas pelo público.É a política, estúpido.
Hoje é o dia em que me sinto um Horowitz.
Alguém que vê um partido tomar decisões erradas atrás de decisões erradas, na hora da campanha, e depois ainda terminar vendo muitas pessoas surpresas dizendo “Como isso pôde acontecer?”. Na verdade, era muito previsível que fosse acontecer. Lembremos que eu apenas torci para estar errado. Não aconteceu.
Bastaria prestar atenção em como o PSDB agiu em algumas questões nesse segundo turno
- Não reagiu ao frame “desaprovado em seu estado”, usado pelo PT magistralmente desde o primeiro dia das eleições. (Aliás, Aécio perdeu em MG de novo)
- Parecia catatônico enquanto o PT acusou Aécio de “agressivo contra as mulheres”, enquanto o mesmo partido tem em seu histórico o apoio a um pedófilo estuprador de meninas (Eduardo Gaievski) e o endosso ao governo venezuelano que quebrou o nariz de Maria Corina Machado. E nada disso foi usado pelo PSDB na campanha. Não me perguntem o motivo.
- Não defendeu Armínio Fraga, trucidado pelo PT. Enquanto isso, Mantega e Mercadante saíram ilesos.
Isso é só para citar alguns exemplos.
É a política estúpido!
Se finalmente aprendermos algo, agora no momento de lutarmos contra o Decreto 8243 e o projeto de censura de mídia, essa derrota terá valido algo.
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