Quando alguém está acometido por uma doença grave, um câncer extremamente agressivo, por exemplo, em geral procura todos os tratamentos que o estado da arte da medicina disponibiliza. Muitas vezes, decisões difíceis se apresentam em bioética, fazendo-se necessário aplicar os princípios da beneficência e da autonomia, nem sempre nessa ordem.
Se não há alternativas seguras, na esperança de obter a cura ou, pelo menos, de contornar os sintomas mais problemáticos, o doente se submete aos riscos das pesquisas envolvendo seres humanos, seja com a finalidade de criar um novo remédio ou de desenvolver novas técnicas terapêuticas. Entre a morte certa e a possibilidade de melhora, ainda que remota, racionalmente o doente costuma escolher correr riscos.
O cenário eleitoral que se afigura não é muito diferente. Temos um diagnóstico certo. O Brasil padece de um câncer terminal.
O partido que está no poder há longos e penosos 12 anos é responsável pelo mensalão, pelo aparelhamento das agências reguladoras e das empresas públicas, pela quebra da Petrobras –e pelos mais recentes escândalos de corrupção na estatal–, pela volta da inflação, pelo esfacelamento do Itamaraty, por obras que nunca acabam, pelo financiamento da ditadura cubana, mediante a vergonhosa importação de médicos e investimento em obras de infraestrutura naquele país, que seriam muito necessárias por aqui.
O câncer que se instalou no país também se materializa no discurso, quase desrespeitoso, de negar o inegável e tratar os eleitores como se fossem seres incapazes.
É preciso mencionar também o autoritarismo de perseguir e de exigir punição daqueles que ousam divergir. A título de exemplo, é possível mencionar a lista de jornalistas supostamente inimigos do governo e a reação à análise técnica feita por funcionários de um banco privado sobre os rumos da economia brasileira em caso de reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Diante desse quadro, com todo respeito aos que vêm sustentando que é melhor ficar com o mal conhecido a arriscar, penso que não resta outro caminho além de apostar na alternativa que se apresenta, ou seja, Marina Silva.
O discurso da candidata é ensaiado? As promessas dela são falsas? Não sei. Quero crer que algo de bom será feito por ela na Presidência, pois penso que é possível conciliar supostos extremos, como o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental.
Não voto enganada! Tal qual um doente que aceita os efeitos colaterais das pesquisas com novos fármacos, voto consciente de que corremos muitos perigos, inclusive o de quem se anuncia como representante do "novo" abrir os braços para o "velho".
Com o fortalecimento de Marina Silva, muitos petistas e simpatizantes do PT se apressaram em dizer que a possível derrota só pode ser atribuída à presidente. E se o problema é com Dilma, nada impede que, no governo de Marina, haja espaço para o PT. Sob todos os aspectos, esse raciocínio de que a culpa é somente de Dilma se revela bastante injusto.
Muitos dos eleitores de Marina Silva estão abraçando o único remédio que se mostra capaz de enfrentar o mal que nos asfixia. Não estamos apenas dizendo "sim" à candidata do PSB, estamos dizendo "não" ao PT.
A maior traição de Marina na Presidência não será uma eventual quebra de promessas, prática que se reitera na vida dos brasileiros, infelizmente. A grande traição será, sim, fingir que a doença era Dilma e permitir a metástase, ou seja, a volta do PT ao governo.
Autonomia é um dos princípios mais importantes em bioética. O doente tem o direito de preferir a morte às incertezas do tratamento. Seja na saúde, seja na eleição, entre o conformismo e o risco, prefiro morrer lutando.
JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL, 40, advogada, é professora livre docente de Direito Penal da USP
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