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sexta-feira, agosto 22, 2014

UCHO HADDAD: Sem Eduardo Campos, voo com destino ao Palácio do Planalto sofre arremetida



Em tese, apenas nessa condição, a ausência de um candidato facilita uma disputa eleitoral. A trágica e inesperada morte de Eduardo Campos, em 13 de agosto, mudou o cenário da corrida ao Palácio do Planalto. Isso deve tornar a disputa ainda mais difícil, pois Marina Silva, candidata a vice na chapa até então encabeçada pelo ex-governador de Pernambuco, deve assumir a candidatura do PSB à Presidência da República.

Por enquanto, o Brasil está no embalo da comoção, até porque morreu um político jovem e com futuro promissor, mas dentro de alguns dias a campanha eleitoral retoma a sua sordidez. Ou seja, os falsos tapinhas nas costas dados nos familiares de Eduardo Campos durante o velório, em Recife, serão substituídos por golpes supostamente certeiros nos subterrâneos eleitorais. Assim é a realidade da política nos bastidores, um universo em que predomina o jogo sujo e rasteiro.

É prematuro e perigoso fazer qualquer tipo de prognóstico sobre quem vencerá a eleição presidencial de outubro próximo, mas pelo menos uma aposta é possível arriscar. Quem mais perde com a ausência de Eduardo Campos é a presidente da República, Dilma Rousseff, candidata à reeleição. Isso coloca por terra todas as ilações maldosas e esquizofrênicas de que petistas estariam envolvidos na queda do avião que matou Campos. Se esse tipo de conjectura insana encontra alguma nesga de espaço na seara da razoabilidade, melhor seria ao PT que Marina Silva tivesse embarcado na aeronave no lugar de Eduardo Campos. Afinal, na última eleição presidencial Marina amealhou quase 20% dos votos válidos depositados nas urnas. O que não é pouco, vale lembrar.

No contraponto, supõe-se que esse contingente de votos arrebatado por Marina foi distribuído no segundo turno da eleição presidencial de 2010 entre José Serra e Dilma Rousseff, cabendo ao tucano pouco mais da metade desse quinhão. O que não significa que obrigatoriamente isso acontecerá com os votos que até então tinham sido cabalados por Eduardo Campos. O cenário do momento é de interrogações e análises.

Há nesse quadro nebuloso alguns pontos a considerar. Dilma Rousseff, que quase quatro anos depois da posse ainda não conseguiu mostrar a que veio, terá mais dificuldade para convencer o eleitor sobre a importância de um novo mandato. Afinal, quem nada fez até agora, nada continuará fazendo. Sem contar que a crise econômica é o maior adversário da petista nessa disputa, uma vez que no cotidiano do trabalhador o salário acaba e o mês continua.

Um dos principais destaques da eleição deste ano é o desinteresse dos cidadãos em relação ao processo sucessório como um todo. Esse descontentamento fica claro no contingente formado por “indecisos” e “brancos e nulos”, que representa quase um terço do eleitorado nacional (aproximadamente 140 milhões de pessoas aptas a votar). Ou seja, se “indecisos” e “brancos e nulos” representassem um candidato, esse seria o próximo presidente da República. O que explica a enxurrada de desmandos que há mais de uma década varre o Brasil. E dependo do resultado das urnas continuará varrendo.

Deixando de lado a visão macro da corrida presidencial e passando a analisar os candidatos de forma isolada, a petista Dilma é que mais terá problemas com a ausência de Eduardo Campos. Se até o último dia 13 de agosto sua situação não era a mais confortável em termos eleitorais, inclusive dentro do próprio PT, de agora em diante seu esforço terá de ser triplicado, caso queira convencer os eleitores fora do seu reduto cativo. O que em minha opinião é missão quase impossível. No capítulo paulista do PT há alguns próceres da legenda que não escondem o descontentamento com a presidente da República e sem qualquer cerimônia têm dito “o pior é que teremos de votar na Dilma”.

O grande teste para Dilma surgirá nas próximas horas, com a retomada dos negócios no mercado financeiro nacional e internacional. Qualquer movimento brusco de tão importante setor poderá representar a decretação antecipada da derrota da candidata do PT, que há muito deixou de merecer os salamaleques do capital. Isso significa que para o PT será ainda mais difícil captar recursos para uma campanha eleitoral que sem a participação de Eduardo Campos será ainda mais cara. Aliás, Lula, que diz estar tentando passar o chapéu diante do empresariado para reforçar o caixa da campanha da sucessora, tem enfrentado inesperadas dificuldades.

O caso de Aécio Neves não é tão complicado, mas o presidenciável tucano terá uma missão dupla a partir de agora. A primeira delas é se reinventar como candidato, levando seu discurso mais à esquerda, como forma de atrair os eleitores de Eduardo Campos que não votarão em Marina, caso ela seja confirmada pelo PSB como cabeça de chapa. A segunda tarefa de Aécio será a de tirar a poeira do espelho retrovisor, pois Marina deve se aproximar, não a ponto de ultrapassá-lo nas próximas horas, mas é preciso atenção por parte do tucanato.

O ponto a favor da campanha de Aécio Neves é que deve aumentar o número de doadores de campanha dispostos a reforçar o caixa tucano. Em tempos de campanha acirrada, o fator financeiro sem dúvida é preponderante, desde que os recursos sejam investidos adequadamente, não usados para financiar marqueteiros fregueses do vedetismo. Em suma, a situação de Aécio no cenário atual é a “menos difícil”, mas o tucano terá pela frente semanas de muita pressão, por causa da necessidade de se aproximar ao máximo de Dilma, o que poderá neutralizar uma chegada abrupta de Marina Silva.

A situação de Marina Silva não é tão confortável quanto parece. Por enquanto os partidos que sustentam a candidatura do PSB estão agindo com cautela, até porque em público seus filiados decidiram não falar sobre quem assumirá o lugar deixado por Eduardo Campos, mas nos bastidores o assunto corre solto e com direito a articulações de todos os lados. A grande pedra no caminho de Marina é o PSB aceitar seu estilo e abraçar sua ideologia política. Esses dois detalhes podem trazer problemas para a candidatura do PSB, cujo novo presidente, Roberto Amaral, é extremamente próximo de Lula e não opera na mesma frequência de Marina Silva.

Amaral, que de chofre foi contra a candidatura do PSB à presidência, teria dito a Marina Silva que ela não será obrigada a permanecer no partido caso seja eleita. Essa declaração, se confirmada, radiografa com precisão o clima que reina no vácuo político-eleitoral deixado por Eduardo Campos.

Outro problema a ser enfrentado por Marina Silva é a captação de recursos para a campanha. Uma coisa é o entusiasmo de parte do eleitorado com a sua chegada à liderança da candidatura, outra é a disposição dos doadores de despejarem dinheiro em uma candidata que é muito mais à esquerda do que Dilma Rousseff e sua turba. Marina tem algumas portas abertas no reduto financeiro nacional, mas um esquerdista arrancar dinheiro de quem vive agarrado ao capitalismo não é tarefa fácil. Ademais, o agronegócio, setor que sempre aposta em eleições presidenciais, quer distância de Marina Silva.

Com o cenário eleitoral no âmbito da Presidência da República totalmente embolado, a disputa será decidida por míseros pontos percentuais. Com isso o presidenciável do PSC, Pastor Everaldo, aumenta o seu cacife para o segundo turno, que de eventual passou a ser considerado como líquido e certo. Oscilando no patamar de quatro pontos percentuais de intenções de voto, Everaldo certamente será cortejado pelos dois candidatos que passarem ao segundo round da peleja. Até lá, o pastor-candidato terá não apenas de manter a visibilidade de sua candidatura, mas aumentá-la em quantidade e qualidade, caso queira sentar-se à mesa de negociações dentro de algumas poucas semanas.

Como a vida muda a cada instante, não se deve desconsiderar o fato de que no plano de voo com destino ao Palácio do Planalto o tempo fechou repentinamente, a visibilidade reduziu de forma considerável e a pista do sucesso encurtou sobremaneira. Conseguirá aterrissar com doses de tranquilidade, depois da inesperada e brusca arremetida, quem estiver com o cinto político afivelado e conseguir manter a estabilidade da campanha, sem jamais tirar o olho do retrovisor, pois o inesperado sempre surge no ar. Do contrário, cair de nariz será inevitável.

(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, cronista esportivo, escritor e poeta.

Fonte: Ucho.info

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