Por André Eduardo Fernandes
Após duas semanas da trágica morte de Eduardo Campos faz-se necessário destacar alguns pontos que devem servir para refletir sobre os rumos da eleição de outubro. O primeiro fato determinante diz respeito a que toda a estratégia de campanha do PSDB estava assentada na disputa entre Aécio-Eduardo-Dilma. Ou seja, seria uma eleição de baixa carga psico-emocional dado o perfil dos concorrentes principais. Na realidade, tal estratégia foi sendo construída nos últimos três anos dentro de um quadro que conseguisse romper com o "quase-monopólio" do eleitorado nordestino e de esquerda por parte do PT. Alguns programas de Eduardo Campos que vazaram mostram que Dilma seria seu alvo números 1, 2 e 3. Ora, com a morte de Eduardo, o desarranjo estrutural na campanha do PSDB é de todo natural, dada a ocorrência do fenômeno do "cisne negro". A alavancagem inicial de Marina dá-se então em um momento decisivo do início da campanha na TV, obtendo a mesma uma superexposição da qual soube tirar o máximo de proveito político. Marina, ao estilo Odorico Paraguássu, soube maximizar sua imagem como uma herdeira do espólio político de Eduardo. Diferente de Odorico, que na peça de Dias Gomes precisava inaugurar o cemitério para ganhar adesão popular, Marina apropriou-se do próprio morto como sua "obra" na imagística social. Entretanto, a partir de agora não podemos simplesmente justificar o crescimento da "onda verde" apenas pelo efeito comoção. Temos que buscar ir além para perceber o que está acontecendo e para podermos ter uma ação política condizente com a realidade. Lutar contra fatos é burrice.
A grande verdade é que a população brasileira tem uma visão bastante edulcorada do jogo político. Assistem e compreendem a política como se fosse em um filme de princesas ou heróis da Disney onde existem os "bons" e os "maus"; onde um herói sempre aparecerá para resolver todas as contradições/conflitos e terminando por gerar um reino de fábulas perfeito e justo. Dentro deste contexto, em um país já altamente contaminado pela ideologia de esquerda (onde somente quem é de esquerda é o "bom"; sendo quem fugir deste papel é o "abominável"), o surgimento de uma figura simbologicamente transfigurada em encarnação de um novo messias atrai a atenção dos eleitores como açúcar atrai formigas. É este o verdadeiro nó górdio da atual eleição. Marina não é uma política tradicional (mas não pelos motivos que seu "mito" e ideologia querem fazer parecer). Marina é um símbolo da encarnação do messianismo acrítico, alimentado por um "coitadismo" típico de vários heróis populares. Votar em Marina, como se pode ver em profusão nas declarações nas redes sociais, é "votar na esperança"; "votar na política dos bons"; "votar na diferença"; "votar por um mundo diferente"; "votar contra tudo que está aí", etc. Ora, eis o messianismo encarnado em suas mais diversas formas. A própria candidata declarou que "irá governar com os bons". Qual o critério de bondade ela tem para definir o funcionamento da política? Por acaso, foi-lhe revelada a verdade do coração dos homens para saber o que é o "bom"? Quando ficou cinco anos no governo de Lula ela já pensava que o importante é estar com os "bons"? Nada disto. Isto é tudo mentira e faz parte da criação de seu mito como o novo messias do Brasil. Marina Silva sempre foi PT. Fez carreira política de 1986 até 2008 no PT sendo eleita vereadora, deputada estadual e depois por dois mandatos como senadora usando a máquina do PT, o financiamento eleitoral do PT, inclusive na eleição de 2002 (gênese do mensalão). Por sinal, esta senhora privilegiada que, pela graça divina, sabe quem são os "bons", ficou no PT e apoiou o partido durante o mensalão (2005). Saiu do PT em maio de 2008 quando Lula fechou o acordo com Zé Dirceu em oficializar Dilma como candidata do PT após a queda de suas mais brilhantes estrelas. Não nos esqueçamos que já no início de 2007, havia um movimento "Marina Presidente" estimulado por ela dentro do PT.
Não saiu do PT por indignação quanto aos métodos do partido, não saiu porque não estava com o que ela agora descobriu serem "os bons", não saiu do PT por discordar de seus pontos programáticos principais, saiu alegando o pretexto de dificuldades em gerir a área ambiental. Lula, como o detentor do atual cargo de Messias do país nunca cederia para Marina a candidatura petista. Não é possível a existência de dois profetas vivos na nova "bíblia" da historiografia moderna brasileira. E o que fez Marina ao sair do PT? Logo procurou uma legenda que a entronizasse como candidata em 2010. Assim, entrou no PV e tornou-se, naquela eleição, o receptáculo de uma enorme quantidade de votos que não queriam o PT, mas não estavam convencidos de votar "na direita" (como se esta direita existisse politicamente com representatividade no Brasil e, ainda mais, no PSDB!!!!). Findo o primeiro turno, o que fez Marina? Ora, como a ungida da verdade e messias da boa nova simplesmente omitiu-se quanto ao segundo turno. Oportunisticamente, era o que lhe cabia em seu projeto que sempre foi pessoal! Que diga o PV! Em sua passagem naquele partido, além de trazer para a pauta uma agenda reacionária não contribuiu em nada para aquela organização, a qual simplesmente parasitou até que a eleição de 2010 acabasse. A ungida e sua seita precisavam de uma igreja própria. Neste ponto, surge o tal do Rede-Sustentabilidade. Apesar de no Brasil existirem dezenas de partido, Marina não conseguiu em três anos assinaturas para criar a sua igreja. Porém, a ungida não poderia sumir da imagística popular e, destarte, filiou-se ao PSB do já saudoso Eduardo Campos. Uma simbiose parasitária perfeita, fato que ela nunca negou, sempre se referindo a Rede mesmo no PSB. A simbiose (!) era boa para ambos para esta eleição. Marina continuaria viva na imaginação popular e Eduardo teria um apoio de peso, mesmo todos sabendo que este ajuntamento tinha data de validade até 5 de outubro deste ano. Portanto, chegamos ao momento atual. Alçada a protagonista em um momento decisivo é preciso que saibamos quem afinal é Marina. A campanha agora se faz contra o inconsciente coletivo de um povo carente de heróis e a espera de um salvador da pátria. Nós, os brasileiros, não gostamos da racionalidade, não encaramos o mundo real, esperamos a salvação por algum iniciado. Somando-se a isto seu aspecto de sofrimento e pobreza. Em dois mandatos de Senadora, ficou 11 anos no Senado e 5 anos (!) no governo do então "bom" Lula. No Senado, em todo este período apresentou somente 57 projetos de lei, sendo que considerando-se a repetição de alguns e outros retirados, limitam-se a 40 projetos. No plenário, ausente em um número absurdo de votações. Votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, apresentou projeto para que os plebiscitos sejam convocados por iniciativa popular, apresentou projeto para controle social do governo, e nada mais.
Como líder de uma igreja sua linguagem passou a ser recheada de bordões enigmáticos e frases de efeito onde a transversalidade é a base da ação. Restam poucos dias para a eleição e a luta contra mais uma farsa na história política brasileira é hercúlea. Os brasileiros parecem crer nos fantasmas que prometem o paraíso. Marina é, por essência, um atraso, por ser a representante da anti-política. Ora, quem diz que governará com os "bons" nos remete a um mundo pré-maquiavel; um paraíso perdido. Quiçá um mundo do além, mas não ao mundo real. Ao reforçar tudo de negativo que o messianismo tem, deseduca politicamente. Marina não constrói, vive da destruição do oponente à sua "fé". Parafraseando o Presidente Cardenas (o pai) do México: "Triste Brasil tão longe da razão e tão próximo do messianismo populista".
Fonte: Blog Ciência Brasil
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