Enquanto o Brasil discute as origens, os descaminhos e
as barbáries do golpe de 1964, o presidente da Venezuela, Nicolás
Maduro, disse à Folha que a culpa pela tragédia do seu país, 50 anos depois, é da direita golpista.
Vá lá que a direita radical venezuelana não é flor que se cheire, mas é
lamentável que o presidente da República tente reduzir a monumental
crise política, econômica e social puramente à ação desses radicais.
Maduro diz que a direita quer o golpe, mas o que a esquerda, o centro, a
direita e boa parte da intelectualidade, do empresariado, das igrejas e
das Forças Armadas querem é estabilidade, liberdade de expressão,
respeito às oposições, controle da inflação –e papel higiênico!
Maduro atua com um tirano, por trás da prisão dos ex-prefeitos Leopoldo
López, Enzo Scarano e Daniel Ceballos e da cassação sumária da deputada
Maria Corina Machado.
E ele não explica e nem mesmo admite a perseguição a TVs, jornais e
jornalistas e desconversa sobre as quase 40 mortes e as dezenas de
feridos e de presos. Convenhamos, não foi a "direita golpista" que fez
tudo isso sozinha.
Imagine-se se, aqui no Brasil, prendessem e cassassem os prefeitos de
cidades onde houve manifestações e/ou "black blocs"? E o argumento de
Maduro de que foram os tribunais que puniram os opositores não vale. No
Paraguai, foram as instituições que cassaram o presidente Lugo, mas o
país acabou punido pelo Mercosul e pela Unasul.
Se em 1964 os EUA efetivamente lideraram os golpes no Brasil, no
Uruguai, no Paraguai, na Argentina e no Chile, não faz muito sentido
imaginar que, hoje, estejam empenhados num único golpe: na Venezuela.
Faltou a Maduro um mínimo de humildade: ele deu um passo maior que a
perna; é o homem errado, na hora errada. E seu mandato vai até 2019, sem
chance de melhorar. Qual o rastro de mortos, feridos, presos e cassados
que deixará na Venezuela até lá?
Fonte: Folha