Tão indesejável quanto a censura é a autocensura. O SBT
acaba de amarrar uma mordaça no único nome que se destacava em seu
pálido telejornalismo. Rachel Sheherazade não poderá mais emitir suas
opiniões no SBT Brasil. Oficialmente, a decisão se estende a
todos os âncoras da emissora. "Essa medida tem como objetivo preservar
nossos apresentadores", diz a nota oficial enviada à imprensa.
Na prática, a autocensura foi a maneira encontrada para
manter a jornalista no ar e, ao mesmo tempo, acalmar as várias fontes
que pediram sua cabeça. De partidos políticos a anunciantes
governamentais, de anônimos nas redes sociais a humorista famoso. O
politicamente correto venceu. O SBT e a liberdade de expressão foram os
grandes derrotados.
Acusada de incitar a violência ao apoiar a atitude de
pessoas que amarraram em um poste um adolescente suspeito de roubo, a
apresentadora verbalizou o pensamento de milhões de pessoas. Porém
vivemos numa extrema correção política. Assumir uma opinião polêmica
pode render açoitamento moral. Foi o que aconteceu. Com histórico de
pensamentos considerados conservadores e até reacionários, a
apresentadora se ofereceu mais uma vez como alvo — e não faltaram mãos
para chicoteá-la.
A tendência mundial é abandonar o telejornalismo "chapa
branca" e aumentar o espaço do telejornalismo opinativo, que convide o
telespectador a se posicionar. Na era da interatividade, o público não
pode ser encaixado numa posição passiva. Precisa ser instigado,
incomodado, estimulado a refletir sobre os assuntos do dia a dia. Quando
os jornalistas dizem exclusivamente aquilo que a maioria do público
quer ler, ouvir ou ver, o jornalismo perde uma de suas funções básicas:
propor o contraditório para que a questão seja debatida.
O direito de pensar diferente é uma das garantias da
democracia. Se o pensamento está certo ou errado, se é criminoso ou não,
discute-se em sociedade — e, se for o caso, recorre-se aos meios legais
para punir eventuais excessos. Reprimir opiniões antes mesmo de
serem emitidas não é a atitude mais produtiva de uma sociedade que se
pretende civilizada e desenvolvida.
É óbvio que todo veículo de comunicação tem seus
interesses comerciais, sua ideologia e, em muitos casos, até objetivos
políticos. Porém a liberdade de expressão de seus jornalistas deveria
sobrepor tudo isso. Ao abafar a voz de sua apresentadora, o SBT abre um
precedente perigoso, e deixa de oferecer uma opinião alternativa ao
telespectador. Por acaso, os 200 milhões de brasileiros pensam sempre da
mesma maneira?
Rachel Sheherazade é, desde ontem, apenas mais uma
leitora de teleprompter, o aparelho acoplado à câmera no qual se lê as
notícias. Caso queira se posicionar diante de um acontecimento
relevante, terá que recorrer à mímica facial. Ou será que ela será
obrigada também a fazer cara de paisagem?
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