A
artista gráfica venezuelana Calavera teve um ideia simples, objetiva,
clara e eficiente: confeccionou cartazes que lembram o que diziam ontem
alguns líderes latino-americanos e o que dizem hoje; o que chamavam, no
passado, de “ditadura” e o que chamam, no presente, de democracia. Ainda
que haja alguma imperfeição na análise (já explico por quê), as peças
são poderosas. Expõem, de maneira desconcertante, a duplicidade moral
das esquerdas. As estrelas dos cartazes são os presidentes Dilma
Rousseff (Brasil), José “Pepe” Mujica (Uruguai) e Cristina Kirchner
(Argentina). Vejam as imagens. Volto em seguida.
Dilma e
Mujica são ex-presos políticos. Na sua biografia oficial, consta que
combateram a ditadura militar de seus respectivos países. É o passado
que aparece em preto e branco, na metade à esquerda da montagem. Vemos
ali forças de segurança reprimindo manifestações de rua. O tempo passou,
os dois abandonaram a luta armada e se tornaram presidentes da
República por intermédio do voto direto. E, ora vejam, são apoiadores
incondicionais de uma ditadura, não exatamente militar, mas militaresca.
Que se
note: mesmo os regimes militasres mais discricionários da América Latina
não contaram com milícias civis armadas em larga escala, como as que
atuam hoje na Venezuela. Havia, sim, grupos paramilitares assassinos — e
isso é lixo político e moral, como sabe qualquer pessoa razoável. Mas
tinham um alcance menor do que o esquema montado pelo chavismo na
Venezuela. Em 21 anos, a ditadura militar brasileira fez, em números
superestimados, 424 vítimas — incluindo os guerrilheiros do Araguaia.
Por razões comprovadamente políticas, são 293 as vítimas. Houve tortura,
assassinatos, desaparecimentos. Não se trata de dizer se é muito ou
pouco. É só absurdo! Quem, já rendido, morreu nas mãos do estado foi
vítima de um crime. Mas sigamos. Em pouco mais de um mês — os protestos
na Venezuela começaram no dia 4 de fevereiro —, o próprio governo admite
que já morreram 28 pessoas.
Não me
surpreende: a esquerda sempre soube ser mais letal. Ora, como ignorar
que os grupelhos extremistas no Brasil, meia dúzia de gatos pingados,
mataram pelo menos 120 pessoas — nessa lista, não estão mortos em
combate, não! Essas 120 pereceram em ataques terroristas. E aqui lembro a
única imperfeição da arte de Calavera, embora isso não diminua a
pertinência do seu trabalho: os que hoje protestam na Venezuela estão,
de fato, pedindo democracia. Não era o caso de Dilma. Não era o caso de
Mujica. Eles eram terroristas e pretendiam implementar em seus
respectivos países uma ditadura comunista.
Assim, a
luta do povo venezuelano, hoje, é muito mais moral do que eram a de
Dilma e a de Mujica. Eles queriam ditaduras com sinal trocado. A
população da Venezuela quer um regime democrático. No passado, era
possível repudiar a “luta” da dupla também por bons motivos, Tratava-se
do confronto de forças opostas em si, mas combinadas na malignidade. No
caso venezuelano, no entanto, não: opor-se às reivindicações da
população corresponde a renegar o regime de liberdades públicas. Ou por
outra: Dilma e Mujica continuam a se alinhar com a ditadura.
A VEJA
desta semana traz uma excelente reportagem sobre a Venezuela. Um dos
textos, sobre Che Guevara, o “Porco Fedorento”, vai ao ponto. Ilustra de
modo inequívoco, a farsa moral esquerdista. Observem como a linha de,
vá lá, raciocínio de Che é a que orienta hoje a escolha de Dilma,
Mujica, Cristina e outros “líderes” latino-americanos. Reproduzo o
texto, publico um vídeo e volto para encerrar.
*
Imagine qual seria a reação se, em 1974, o general presidente do Brasil Emílio Garrastazu Médici ocupasse a tribuna diante da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, e afirmasse: “Temos que dizer aqui o que é uma verdade conhecida. Torturas, sim! Temos torturado: torturamos e vamos continuar torturando enquanto for necessário”.
Médici
seria, justamente, execrado como um ditador. Em dezembro de 1964,
porém, o argentino Ernesto Guevara, que, com o apelido de “Che”, ajudou
Fidel Castro no triunfo do golpe comunista em Cuba, foi à ONU e
confessou: “Nosotros tenemos que decir aquí lo que es una verdad
conocida: fusilamientos, sí, hemos fusilado; fusilamos y seguiremos
fusilando mientras sea necesario”.
Já
se passavam seis anos da tomada do poder pelos comunistas em Cuba, e
Guevara confessava que continuava em plena operação e sem data para
arrefecer sua máquina de assassinatos políticos na prisão de La Cabaña.
Seis anos de execuções sumárias de vítimas que chegavam ao paredão
exauridas, pois delas se tirava até parte do sangue para transfusões.
Seis
anos, e dissidentes continuavam a ser fuzilados. Guevara foi o único
guerrilheiro a matar muito mais gente de mãos atadas e olhos vendados do
que em combate — que, ao contrário da lenda, ele evitava ainda mais do
que o banho. Qual foi a reação naquele instante em que permaneciam na
audiência uma maioria de representantes de países “não-alinhados”,
eufemismo para “pró-soviético”? Guevara foi aplaudido por 36 segundos.
No
New York Times do dia seguinte, o redator, mesmerizado, fingiu que não
ouviu a confissão de assassinato de Guevara, descrito como “versátil”,
“economista autodidata” e “revolucionário completo”. A duplicidade ética
não é uma exclusividade das esquerdas. Apenas elas são inexcedíveis
nesse truque que, apesar de velho, ainda funciona. O ensurdecedor
silêncio enquanto jovens mártires venezuelanos são torturados e mortos
nas ruas é prova disso.
Para encerrar
Vejam esta foto.
Este que
está pondo a venda nos olhos do rapaz que vai ser executado é Raúl
Castro quando jovem. O tarado moral é hoje presidente de Cuba. Era um
dos mais eloquentes na solenidade que marcava um ano da morte de Chávez,
há alguns dias. Foi nesse evento que Nicolás Maduro convocou as
milícias armadas a sair às ruas.
Com o apoio de Dilma.
Com o apoio de Mujica.
Com o apoio de Cristina, entre outros.
Não é que esses gênios morais sejam contra matar gente. Eles se opõem a que se matem apenas as pessoas erradas, entenderam?
Por Reinaldo Azevedo