Ativistas usam redes sociais da internet para convocar 'Marcha da Família com Deus' em mais de 200 cidades
Eles acreditam que há uma revolução comunista em curso no país, são
contra a corrupção e o aparelhamento do Estado, utilizam as redes
sociais para fazer oposição ao governo do PT e aliados e enxergam a
intervenção militar como única solução.
Esse é o perfil, ainda que genérico, dos ativistas que pretendem, no
próximo sábado, realizar a 'Marcha da Família com Deus' em São Paulo, no
Rio e em outras cerca de 200 cidades.
Até a conclusão desta edição, mais de 3.000 pessoas haviam confirmado
presença em um dos eventos convocados pelo grupo no Facebook.
O ato será uma reedição da Marcha da Família com Deus pela Liberdade
que, em 19 de março de 1964, reuniu cerca de 200 mil pessoas em São
Paulo. Sob o argumento da "ameaça comunista", eles pediam a deposição do
presidente João Goulart.
As ideias para a próxima marcha misturam antigos temores ("um golpe
comunista marcado para esse ano") com novos atores ("o PT, com o apoio
de partidos de esquerda, da Mídia Ninja").
A principal reivindicação é uma intervenção militar, cujos objetivos
seriam acabar com a corrupção, retirar do poder políticos considerados
corruptos, promover a moralização dos três Poderes e, posteriormente,
convocar novas eleições para a criação de um governo constituído apenas
por "fichas limpas".
Bruno Toscano Franco, um dos organizadores da nova 'Marcha da Família', que será realizada no dia 22 de março
O que aconteceria após a tomada do poder e quem seria a nova classe
política a comandar o país, porém, não parece claro para a organização,
que se diz apartidária.
"Seria constituído um governo provisório, de três meses, e eles
convocariam novas eleições, mas em urnas que não sejam fraudadas",
explica o organizador Bruno Toscano, 40, que diz não confiar nos atuais
equipamentos eletrônicos e, por isso, anula seu voto há quatro eleições.
Questionado sobre quem poderia compor esse novo governo, Toscano diz
achar difícil citar nomes. Para ele, "nenhum político que está aí serve
para alguma coisa", embora admita que a mudança passaria pela estrutura
clássica dos partidos.
Outra organizadora da marcha, Cristina Peviani, 51, partilha da opinião
de "que tudo o que está aí é ruim". Embora tivesse apenas dois anos
quando o regime foi instaurado, Peviani fala com indisfarçável
saudosismo do período militar, que não considera ditadura.
"Eu não vi nenhum general morrer milionário. As escolas públicas eram de ótima qualidade e havia respeito à família e à ordem."
Questionada sobre práticas como tortura e perseguição a opositores do
regime militar, Peviani afirma não concordar com os métodos, mas deixa
claro acreditar que o país vivia em guerra.
"Eu nem sei se eles adotaram isso [a tortura]. Porque o pessoal que diz
que foi torturado está tão gordo, tão forte, tão bonito, né? Eu vi lá na
comissão [da Verdade de São Paulo], que eles não tinham uma marquinha
sequer. Mas, o seguinte: era uma guerra entre o bem e o mal. Os dois
mataram. Eu tenho uma lista imensa de soldados mortos pelo comunistas."
Um dos apoiadores da marcha no Rio, o técnico em segurança do trabalho
Maycon Freitas, 31, diz não não ser totalmente favorável à intervenção
militar por não saber exatamente quais intenções estariam por trás
disso.
Ele também é a favor do fim da corrupção e diz acreditar que maus políticos estão presentes em todos os partidos.
Freitas aproveita a marcha para lançar um apelo aos partidos
identificados com a direita, como PSDB e DEM, que, em sua avaliação,
estão descolados da juventude. "A esquerda faz muito bem esse trabalho
de recrutar jovens para a ideologia enquanto a direita está com freio de
mão puxado e não dá nenhum suporte à juventude", diz.
Fonte: Folha de São Paulo 16/03/2014