O Brasil perdeu mais uma oportunidade histórica de se colocar à altura de seu papel de liderança no continente.
Com a crise política, econômica e social na Venezuela e a escalada
crescente da violência e a ameaça real à estabilidade institucional do
país, esperava-se do governo brasileiro uma ação diplomática pró-ativa e
firme, coerente com a tradição centenária do Itamaraty, pautada no
respeito aos direitos humanos, à defesa da liberdade e da democracia.
Ao assinar as notas do Mercosul e do Unasul que emprestam respaldo ao
presidente Nicolás Maduro, o Brasil ignora as respostas que o governo
venezuelano tem dado às manifestações de protesto, com flagrante
repressão contra toda e qualquer oposição ao regime e o cerceamento
ostensivo à liberdade de expressão. Soma-se à vocação autoritária do
chavismo uma grave instabilidade econômica, com a maior inflação da
América Latina (57%) e a menor taxa de crescimento (1,1%). Arruinado
pela má gestão, o país expõe seus cidadãos a uma rotina de escassez de
alimentos e de energia.
No lugar de oferecer colaboração institucional para a promoção do
diálogo entre as forças políticas em conflito, o Brasil submete sua
política externa às conveniências ideológicas, deixando de representar
os interesses permanentes do Estado brasileiro para defender o ideário
do governo de plantão.
Longe de ser um fato isolado, a posição se inscreve no rol de desacertos
desde que o governo impôs à atuação da Chancelaria o viés partidário.
Nunca é demais lembrar episódios como a aceitação dócil da expropriação
das refinarias da Petrobras em Santa Cruz, em 2006; a deportação dos
boxeadores cubanos nos Jogos Pan-Americanos de 2007 e o tratamento dado
ao senador boliviano exilado na Embaixada em La Paz. Onde está a
coerência com a atitude adotada na crise paraguaia, em que foi invocada a
cláusula democrática do Mercosul? Por afinidades ideológicas, o Brasil
está deixando de assumir suas responsabilidades internacionais também na
questão dos direitos humanos.
A partidarização da política externa tem consequências também na
política de comércio exterior. As crises na Venezuela e na Argentina,
pela passividade da reação do Itamaraty, estão trazendo prejuízos à
credibilidade do governo brasileiro e às empresas nacionais que
encontram barreiras para exportar e grandes dificuldades para receber
seus pagamentos.
O mundo desconfia do Brasil, e não é à toa. Pouco adianta a presidente
da República reafirmar no concerto internacional a posição do Brasil
como país aberto, democrático, que respeita as regras internacionais,
se, na prática, damos guarida a governos autoritários que desprezam a
democracia e o Estado de Direito.