Ao defender sua tese de Doutorado em Solos, no final do mês passado, na Universidade Estadual de Londrina (PR), Rogério Ferreira da Silva, tornou-se um dos primeiros índios brasileiros com Doutorado no país. Ele foi integrante do programa de doutorado da Universidade Estadual de Londrina-PR (UEL), sendo orientado pela professora Maria de Fátima Guimarães e co-orientado pelo pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Embrapa, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Fábio Martins Mercante.
E foi na Embrapa Agropecuária Oeste, em Dourados-MS, que seu trabalho de tese foi desenvolvido. “Biofuncionamento e sustentabilidade de solo em diferentes agroecossistemas no Estado do Mato Grosso do Sul” foi defendida por Rogério visando intensificar o conhecimento do funcionamento biodinâmico do solo, buscando a sustentabilidade dos sistemas de produção. Desta forma, o projeto procurou minimizar os impactos sofridos pelo solo pela ação das atividades agrícolas.
Porém, até chegar ao título de doutor Rogério percorreu seu caminho com perseverança e muita força de vontade, principalmente pertencendo a um grupo de minorias étnicas. Indígena da etnia terena, últimos remanescentes da nação Guaná, originário da aldeia Cachoeirinha (Miranda-MS), o novo doutor descobriu cedo que somente através dos estudos escreveria uma biografia diferente. “Não podia ficar na aldeia vendo meus pais sofrendo”, afirma.
Já aos 7 anos, trabalhava na roça para ajudar no sustento dos irmãos mais novos. Somente aos 17 anos conseguiu ir para Cuiabá-MT fazer um curso técnico em agropecuária na Escola Agrotécnica Federal de Cuiabá, com pleno apoio dos pais. Ele lembra que “meu pai completou apenas o ensino primário e minha mãe é analfabeta e sempre estiveram comigo, me apoiando e incentivando”.
Do Centro-Oeste foi parar no Rio de Janeiro, tentar Agronomia na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Logo no primeiro ano, foi reprovado. Mas não desistiu, procurou a Funai-RJ e conseguiu apoio de uma conselheira da instituição, na época professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A partir disso, ela e sua família o auxiliaram a ter condições para enfrentar o vestibular. “Muitos vestibulandos estudavam um período apenas, eu estudava oito horas, diariamente, para tentar acompanhar”. Infelizmente, essa dificuldade era resultado do ensino fundamental precário que recebeu.
Tanto empenho valeu a vaga no curso de Agronomia da UFRRJ, em 1995. De lá para cá construir uma história ímpar não foi nada fácil, “há discriminação até na maneira de olhar, não adianta esconder”, revela e “a educação é um dos caminhos. Através dela conheceremos nossos problemas, buscaremos soluções e seremos respeitados”, completa.
Desde 2001, o agrônomo é bolsista na Embrapa Agropecuária Oeste, onde desenvolve diversos estudos relacionados à qualidade do solo, com a orientação do Dr. Fábio Martins Mercante, que ressalta “a história dele merece ser contada”. Para Rogério “sua trajetória é mais uma prova de que as minorias têm capacidade de vencer”. E hoje, o filho mais velho incentiva seus irmãos caçulas a estudar, a encontrar um lugar ao sol.
De acordo com a Fundação Nacional do Índio (Funai) a população indígena do Brasil é de 345 mil, distribuída em 215 etnias, considerando somente os indígenas que vivem em aldeias. Entretanto, há estimativas entre 100 a 190 mil habitando fora dos territórios, inclusive áreas urbanas. Desse total, somente 1,3%, menos que 0,5%, consegue ingressar no ensino superior.
Dalízia Aguiar - DRT/MS 28/03/14
ACE - Embrapa Agropecuária Oeste - Dourados/MS
(67) 3425-5122 r.: 180 - dalizia@cpao.embrapa.br
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