O Senado Federal abriu hoje um grave precedente, ao aprovar um Projeto de Lei de Biossegurança sem a exigência do licenciamento ambiental para que os transgênicos sejam liberados no País. Ao aprovar o substitutivo do senador Ney Suassuna (PMDB-PB), os senadores põem o Brasil sob o sério risco de ver o meio ambiente simplesmente ignorado por leis e projetos futuros.
O Greenpeace fez várias manifestações diante do Congresso Nacional e Palácio do Alvorada nas últimas semanas em Brasília (DF), exigindo respeito à opinião da população e ao meio ambiente, por parte do poder público. No dia 22 de setembro, ativistas caracterizados como representantes das grandes corporações (como a Monsanto), carregaram em direção ao Palácio do Planalto uma bola de "chumbo" gigante, marcada com o símbolo da rotulagem dos produtos transgênicos e ligada a uma corrente. A ação correspondia ao fato de o País estar sendo "acorrentado" aos OGMs (organismos geneticamente modificados) e aos interesses de grandes empresas.
A concessão do poder de decisão à CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) para a liberação comercial dos transgênicos é outro grave problema do texto aprovado, que desfigurou completamente a lei apresentada inicialmente pelo governo. O Projeto de Lei original assegurava que os ministérios do Meio Ambiente e da Saúde teriam a palavra final sobre o tema - depois de realizar as avaliações de impacto de cada transgênico. A proposta original do governo foi fruto da discussão entre vários órgãos do poder executivo, elaborado inclusive com a participação da sociedade civil.
"Segundo o texto que agora retornará à Câmara dos Deputados, a CTNBio passará a ter mais poderes do que os ministérios, impondo suas decisões aos ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. Isso é absolutamente inconstitucional, já que são os ministérios que possuem a competência técnica para a avaliação de riscos dos transgênicos(1)", afirmou Ventura Barbeiro, da Campanha de Engenharia Genética do Greenpeace. "Como poderá o Ministério da Saúde ou do Meio Ambiente atuarem em sua área de competência legal, se não terão a autonomia necessária para realizar avaliações dos produtos transgênicos? Esperamos que a Câmara dos Deputados rejeite a proposta do Senado e volte ao seu texto original, como foi aprovado anteriormente".
A CTNBio tem um importante papel técnico consultivo a desempenhar. No entanto, não deve ter a última palavra sobre os transgênicos, já que não realiza todas as análises ou estudos sobre a interação desses organismos com o meio ambiente e a saúde da população. Além disso, a CTNBio é apenas uma comissão vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia que, por sua vez, não tem competência técnica nem legal para zelar pela saúde pública e pelo meio ambiente. Essa função é de competência dos órgãos de controle e fiscalização dos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. O PL aprovado apresenta ainda outras sérias deficiências, como a liberação irrestrita do cultivo de qualquer variedade de soja transgênica no País que já tiver sido registrada no Ministério da Agricultura, entre outros (2).
Da forma como foi aprovada pelo Senado, a Lei de Biossegurança coloca o Brasil na desvantajosa condição de produtor transgênico, que apóia os interesses corporativos, ignora a opinião da população brasileira (3) e atropela o Princípio da Precaução. Segundo este preceito, a falta de certeza científica e a existência de um risco de dano sério ou irreversível de determinada situação requer a aplicação de medidas que possam prever esse dano.
As consequências da liberação irrestrita de OGMs no meio ambiente são imprevisíveis e podem ser irreversíveis, pois não existe consenso nem mesmo na comunidade científica sobre sua segurança. Entre os riscos que representam para o meio ambiente, estão a poluição genética, a perda de biodiversidade, o surgimento de ervas daninhas resistentes a herbicidas, o aumento do uso de agrotóxicos e a perda da fertilidade natural do solo.
NOTAS:
(1) O artigo 87 da Constituição Federal dispõe sobre as atribuições dos ministérios, entre as quais está a de "exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência".
(2) Ao mesmo tempo em que determina que o número de representantes do setor de biotecnologia na CTNBio deve aumentar, o texto aprovado pelo Senado reduz a participação do setor de biossegurança na comissão. Além disso, as audiências públicas serão facultativas e as decisões da CTNBio prevalecerão, se o Conselho de Ministros não se manifestar no prazo de 30 dias. O corpo do Conselho (CNBS), por sua vez, será diminuído de 15 para 11 representantes, sem qualquer justificativa.
(3) Nova pesquisa encomendada pelo Greenpeace indica que mais de 80% dos brasileiros acreditam que os transgênicos não deveriam ser liberados no País (pesquisa ISER, julho 2004).
MAIS INFORMAÇÕES COM GREENPEACE:
- Elisa Almeida França, assessoria de imprensa, (11) 3035-1189, (11) 9169-7950
- Ventura Barbeiro, Campanha de Engenharia Genética, (11) 3035-1168, (11) 8245-2248
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