Área ex-Monsanto, ocupada há cerca de um ano por trabalhadores sem-terra e agricultores familiares, agora abriga o Centro Chico Mendes de Agroecologia, colhe sementes crioulas e produz alimentos sem agrotóxicos.
De 12 a 15 de maio de 2004, a cidade de Ponta Grossa, no Paraná, irá sediar a Jornada de Agroecologia, evento que pretende reunir mais de cinco mil pessoas em oficinas temáticas, manifestações públicas, apresentações culturais, conferências e debates em torno do tema: “Construindo um Projeto Popular e Soberano Para a Agricultura Camponesa”. Ao mesmo tempo em que a Jornada de Agroecologia se fortalece enquanto uma articulação permanente de entidades ligadas aos trabalhadores do campo (acampados, agricultores familiares, ONGs e movimentos populares), seu encontro anual se consagra como momento de reflexão, definições coletivas e de ação propositiva em defesa da vida, no combate aos organismos geneticamente modificados (OGM) e a práticas produtivas nocivas ao ambiente e à saúde humana.
As atividades da Jornada de Agroecologia acontecerão no Centro de Eventos de Ponta Grossa e, para estas, já estão confirmadas as presenças de especialistas e autoridades do Brasil e de outros países, que irão traçar as diretrizes desse projeto popular para a agricultura, um panorama da situação nacional e internacional da guerra contra os transgênicos, discutirão o plano de ações das organizações ligadas aos trabalhadores do campo ao longo deste ano, bem como a promoção de mutirões agroecológicos e manifestações de combate ao avanço dos OGM. Um ponto forte do evento será a troca de conhecimentos técnicos e de experiências de manejo agroecológico entre os próprios agricultores. Paralelamente às atividades realizadas no Centro de Eventos, a Jornada estará promovendo feiras de alimentos agroecológicos no centro da cidade e abrirá espaço para debates com a população de Ponta Grossa sobre os assuntos ligados ao encontro.
Na opinião do coordenador da AS-PTA no Paraná, José Maria Tardin, “a Jornada de Agroecologia tem estreita ligação com o avanço de políticas públicas no Paraná nas áreas de agricultura, abastecimento e educação, por exemplo, e com a conquista de decisões mais agressivas por parte do governo estadual no combate aos transgênicos”. “Ela tem sido uma articulação forte na negociação, elaboração, mobilização e tramitação de processos contra os organismos geneticamente modificados. Também é responsável por colocar na agenda política do Estado do Paraná essa luta que, até então, estava restrita aos movimentos sociais”, completa Tardin.
Ex-Monsanto agora colhe alimentos saudáveis
Desde o ano passado, os 48 hectares das antigas instalações do Centro de Pesquisas de Milho e Soja Transgênicos da Monsanto em Ponta Grossa estão ocupados por famílias de trabalhadores sem-terra e agricultores familiares, que se dedicam à conversão dessa área em lavouras agroecológicas para a produção de sementes crioulas que, uma vez colhidas, são repassadas para assentamentos e comunidades rurais de agricultura familiar. Além disso, as famílias cultivam pomares e uma horta comunitária para sua subsistência. A área foi rebatizada de “Centro Chico Mendes de Agroecologia”.
“As organizações da Jornada de Agroecologia suspeitavam que a área fosse destinada à multiplicação de sementes transgênicas e de que havia irregularidades ambientais nos experimentos da Monsanto. Todas essas suspeitas foram confirmadas por laudos técnicos do Ministério Público Estadual e da Secretaria de Agricultura do Paraná. Entre os abusos verificados, foram encontrados o plantio de transgênicos em área maior que a permitida, a plantação em área de preservação permanente e a falta de proteção da mata ciliar, que deveria impedir que os resíduos das lavouras fossem parar dentro do rio. Encontramos lavouras que vão até dentro da água e quatro hectares com plantio de milho transgênico”, argumenta o advogado Darci Frigo, coordenador da organização de direitos humanos Terra de Direitos. Essas denúncias foram levadas ao Tribunal Internacional sobre os Transgênicos, no dia 11 de março de 2004 em Porto Alegre, RS, e resultou na condenação da Monsanto e da Farsul por contrabando e disseminação ilegal dos transgênicos no Brasil. O Tribunal contou com a presença de representantes dos maiores produtores de soja do mundo: Estados Unidos, Argentina e Brasil.
Para o último dia da Jornada (15/05), está prevista a realização de um grande ato, que marcará a inauguração oficial do Centro Chico Mendes de Conservação da Agrobiodiversidade, Melhoramento Genético de Variedades Crioulas e Formação em Agroecologia, e acontecerá também a exposição de 15 toneladas de sementes crioulas de feijão, milho e arroz, classificadas e padronizadas, colhidas na antiga área da Monsanto. O evento irá reunir não só os participantes da Jornada, mas caravanas de agricultores e personalidades vindos de todo o Paraná, de outros estados, bem como contará com a presença de autoridades nacionais e internacionais. Foram convidados para o ato do dia 15, o governador do Estado do Paraná, Roberto Requião, e a ministra do Meio Ambiente, Marina da Silva. A atividade deverá começar por volta das 9h.
Proibição dos Transgênicos no Paraná
Apesar de suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal, a Lei paranaense de proibição dos transgênicos ainda não teve seu mérito julgado. O governo do Estado recorreu da decisão do STF, por meio de representação da Procuradoria Geral do Estado, vem desenvolvendo outras ações e as entidades que participam da Jornada de Agroecologia estão movendo esforços, pressionando as autoridades federais e o Congresso Nacional, para a aprovação da Lei de Biossegurança, que resguarde os princípios da precaução e do respeito com relação à saúde dos consumidores e a proteção ambiental.
O governo do Paraná também reforçou a fiscalização e o monitoramento das lavouras de milho e soja no Estado. Estima-se que mais de 100 mil propriedades rurais paranaenses plantem soja. Este ano, um levantamento feito por amostragem pela Secretaria de Agricultura em 8.300 áreas plantadas com soja constatou a presença de transgênicos em apenas 32 delas. Essas 32 áreas foram interditadas e o governo analisou toda a documentação referente à compra de nutrientes e insumos, a fim de monitorar o uso de agrotóxicos, em especial do glifosato no pós-emergente, que é proibido por lei, bem como cobrou o “termo de compromisso” exigido pelo governo federal dos produtores de transgênicos.
No Porto de Paranaguá, os técnicos da Claspar e da Seab também exigem a apresentação de documentação completa sobre o transporte de mercadorias (é o caso da fiscalização do laudo de transgeníase) e tiram amostras das cargas para esses testes.
Jornalista: Thea Tavares (MTb 3207 – PR)
Contatos:
Coordenação da Jornada de Agroecologia, com Darci Frigo – (41) 232-4660, José Maria Tardin – (42) 523-4074, Joka – (41) 323-1162 e Amadeu Bonato – (41) 262-1842, ramal 200.
Entidades Promotoras da Jornada de Agroecologia:
AOPA – Associações da Agricultura Familiar – STR’s – AS-PTA – Assesoar – CPT – Cre$ol/Baser – Deser – Fetraf-Sul/CUT – Fórum Centro-Sul – Fórum Oeste – IAF – MAB/CRABI – MPA – MST – Rede Eco Vida – Rureco – PJR – OMTR – Terra de Direitos.
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