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terça-feira, fevereiro 10, 2004

Sobra milho no país, mas é difícil exportá-lo

Os estoques mundiais de milho estão nos mais baixos níveis da história e o Brasil deverá produzir uma safra acima do consumo pelo segundo ano consecutivo. O país teria tudo para matar parte dessa fome de milho no mundo e elevar ainda mais as receitas com o agronegócio.
Teria, não fosse um pequeno problema de logística. As exportações do cereal deverão ser interrompidas em março e só serão retomadas em setembro. De abril a agosto, os portos, principalmente o de Paranaguá (PR), estarão com força total na exportação de soja.
Segundo dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, os estoques mundiais de milho caíram para 67,5 milhões de toneladas em 2003 -apenas 10,5% do consumo. Os estoques mundiais, que já atingiram 46% do consumo anual na década de 80, estão baixos e caíram mais acentuadamente nos últimos anos porque desde 2000 a produção está abaixo do consumo.
O Brasil, ao contrário, produz mais do que consome. O país, que já teve safra recorde em 2003, voltará a ter boa oferta em 2004. Os primeiros números da colheita de verão, já iniciada, mostram uma produtividade bem acima das expectativas no Paraná, o líder nacional em produção.
No entanto não será fácil exportar o excesso de produção devido ao grande volume de soja que será exportada neste ano. "Há dois anos o Brasil exportou 15 milhões de toneladas de soja. Neste ano serão 25 milhões de toneladas, e as vias de saída são exatamente as mesmas", diz Fernando Muraro, analista da Agência Rural, de Curitiba (PR). "A safra cresce, mas a infra-estrutura não acompanha."
Esse cenário traz uma dose de incerteza para os produtores de milho. Além de deixar o produto praticamente dependente da procura interna (o que pode derrubar os preços), as cooperativas e indústrias começam a limpar os armazéns -e jogar ainda mais produto no mercado- para deixar espaço livre para a supersafra de 59 milhões de toneladas de soja.
"As exportações de milho nesta safra vão depender de uma demanda muito forte do mercado externo e do comportamento do câmbio. Uma desvalorização maior do real torna o produto brasileiro mais competitivo no mercado externo", diz Muraro.
Outro fator que pode jogar a favor do Brasil são as expectativas de plantio dos norte-americanos, que deverão ser divulgadas nas próximas semanas. Os preços da soja estão tão elevados que muitos produtores dos EUA já manifestaram intenção de trocar o cultivo do milho pelo de soja. Se isso ocorrer, a demanda mundial fica ainda mais aquecida.
Muraro acredita, no entanto, que a procura interna por milho deverá ser boa porque a demanda externa por carnes brasileiras está aquecida. O Brasil bateu recordes nas vendas externas de carne de frango, e a tendência para este ano é de crescimento ainda maior devido à gripe do frango na Ásia. Mesmo assim, ele acredita que os preços médios deste ano serão inferiores aos registrados em 2003.
Pelas contas de Muraro, sobraram pelo menos 5 milhões de toneladas de milho da safra de 2003. Esse volume, acrescido dos 33 milhões que serão produzidos na safra de verão e dos 12,7 milhões da safrinha, garantirá ao país uma oferta de 51 milhões de toneladas. O consumo nacional pode chegar a 40 milhões de toneladas, e as exportações, a 4 milhões. Sobram 7 milhões de toneladas, diz ele.
Com esses números de oferta de milho, o país deixa de ser tão dependente da safrinha, como ocorreu nos anos anteriores. Mesmo que haja quebra de produção no inverno, não haverá redução substancial na oferta nacional.
A Agência Rural traça ainda dois cenários para a safrinha. Primeiro, mesmo com a quebra de 20% na safrinha, a produção nacional seria de 43 milhões de toneladas. Segundo, se a quebra chegar a 35%, a produção total seria de 41 milhões de toneladas, ainda acima do consumo nacional.
Em setembro, quando o país retomar as exportações de milho, os preços devem subir, diz Muraro. O câmbio e a demanda mundial ditarão o volume exportado, que, se for grande, jogará as cotações internas para cima.

Fonte: Folha de S. Paulo

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