Café produzido sem agrotóxicos no interior de Minas é um dos principais destaques da pauta de produtos brasileiros que serão expostos na Alemanha, durante a Biofach 2004. Trata-se da maior feira internacional de agricultura orgânica, que será realizada em Nurembergue, de 19 a 22 de fevereiro. A ida de 45 produtores brasileiros ao evento objetiva mostrar o lado ambientalista da agroindústria nacional, com benefícios sociais e econômicos para o Brasil. Lá os produtores poderão negociar diretamente com compradores do exterior em rodadas de negócios.
Há dez anos na cafeicultura orgânica, o fazendeiro Ivan Caixeta não tem do que reclamar. Ao contrário. Com o tempo e os resultados positivos alcançados no café, ele e familiares foram transformando as lavouras existentes em sete fazendas, na região de Machado e de Paraguaçu, no sul de Minas Gerais, em orgânicas.
Hoje, as propriedades produzem, além do café, feijão e mamona para a comercialização, e outras culturas para consumo interno. O café e a mamona também serão expostos na Biofach 2004.
Caixeta, o pai, quatro irmãos e uma tia fazem parte de um grupo familiar batizado de Unicom (União dos Cafeicultores de Machado), ao qual pertencem as sete propriedades e no qual estão cinco gerações de plantadores de café. “Temos trabalhado em conjunto”, conta ele, lembrando que decidiu transformar sua própria fazenda em orgânica quando viu, como engenheiro agrônomo, o sucesso conquistado em outras propriedades da região de Machado, conhecida e valorizada nacionalmente por causa deste tipo de lavoura.
O processo de transformação das lavouras de café soma dez anos, sendo que apenas uma das sete fazendas ainda não completou o período exigido para ser considerada totalmente orgânica. As fazendas variam de tamanho, a menor tem 12 alqueires e a maior 46. A produção deste ano ficará em torno de 8,5 mil sacas de café, bem maior do que a do ano passado, que não passou de duas mil sacas (em função da bianualidade da produção cafeeira). Em 2002, as fazendas renderam 11 mil sacas, porém nem toda a produção foi de orgânico.
O café do grupo Unicom, comercializado com o selo BCS Öko Garantee (certificadora alemã), já tem, em grande parte, destino certo. Cerca de 75% da safra é exportada para o Japão, clientes preferenciais. Os japoneses, explica Caixeta, pagam pelo café brasileiro bem mais do que os europeus. No Japão, a saca é vendida em torno de RUS$ 160, enquanto na Alemanha alcança paenas US$ 130 e nos Estados Unidos cerca de US$ 140.
Com o apoio do Banco do Brasil e da embaixada brasileira no Japão, os fazendeiros estreitaram as relações comerciais com os japoneses por meio de um órgão do governo que cuida das importações do país. Mas o grupo também já exportou para China, Austrália e Estados Unidos e quer tentar o mercado europeu que, segundo Caixeta, é menos interessante por sofrer uma concorrência muito grande de produtores de latinos e da América Central.
O que não é exportado pelo Unicom é vendido para torrefadoras no sul de Minas e também no Ceará. “Tentamos sempre produzir o café gourmet e por isso o que vai para o mercado interno também é especial”, diz ele. Esta será a segunda vez que Caixeta participará da Biofach representando o grupo familiar.
No ano passado, ele esteve na Alemanha com apoio da APEX-Brasil. “Mas não conseguimos fechar negócios”, lembra, ressaltando que os contatos feitos podem render negócios posteriormente, como aconteceu quando participou também da feira de orgânicos, em Bolonha, na Itália. “Estamos fechando negócios só agora”, conta.
Apesar do forte do Unicom ser café, o grupo tem apostado em várias outras culturas orgânicas. As seis fazendas em Machado (Gerezim, Viramão, Alto do Viramão, Serra Negra, Monte Ebron e Ouro Verde) produzem também mamona, feijão, milho cana, banana, mandioca orgânicos, mas, tirando o feijão e a mamona, os outros produtos são consumidos internamente. Em Paraguaçu, a propriedade tem também milho e soja (em fase de transição). A produção do feijão é ainda pequena (cerca de 300 sacas por ano) e é vendida no mercado interno. O motivo é que a comercialização tem que ser muito ágil, numa média de três meses depois do feijão ser colhido.
A mamona será apresentada aos alemães e comerciantes de outros países pela primeira vez. A chamada torta de mamona serve como adubo para as lavouras orgânicas e o óleo retirado pode ser utilizado como combustível, o que faz parte de um projeto da prefeitura de Varginha, cidade vizinha a Machado.
“Temos o maior prazer em produzir orgânicos”, diz o fazendeiro, garantindo que nunca a família, que está no ramo há 140 anos, se arrependeu da transformação das lavouras. “Vemos o meio ambiente respondendo ao nosso esforço, os trabalhadores não sofrem risco de contaminação e os preços também compensam”, atesta. “Os resultados são mais demorados, é mais trabalhoso, tem que ter muita perseverança, mas vale a pena”, garante ele.
O fazendeiro destaca também as vantagens do café orgânico para o comércio internacional brasileiro e a entrada de dólares no país. Caixeta faz as contas e ressalta que o exportador do café comum acaba devolvendo aos países estrangeiros cerca de 50% das divisas alcançadas com as vendas. É que, de acordo com o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), 50% dos insumos e fertilizantes utilizados pela cafeicultura tradicional são importados. “Nós não mandamos pra fora nenhum dólar do que conseguimos lá”, diz Caixeta.
Qualidade
Segundo Ricardo Villela, técnico do Sebrae Nacional responsável pela participação brasileira na Biofach, cresce no Brasil a preocupação com a qualidade dos produtos orgânicos para conquistar o mercado internacional.
“É necessário mudar a visão de que os produtos orgânicos são encontrados em pequenas quantidades e estão apenas nas feirinhas de final de semana”, afirmou Villela. “Há um mercado que demanda uma produção mais forte e que busca um mercado bem mais abrangente”, observou. Em conseqüência, a produção está conquistando novos produtos. “Não é só de frutas, verduras e legumes que sobrevive o mercado orgânico mundial. Carnes, mel, flores, cachaça e até cosméticos estão sendo produzidos de forma orgânica”, disse.
Para viabilizar o estande brasileiro na Biofach, um convênio entre a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha e a APEX-Brasil (Agência de Promoção de Exportações) foi realizado. O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), as instituições não governamentais, Planeta Orgânico e IBD (Instituto Biodinâmico), e a BCS (Certificadora BCS Öko-Garantie - certificadora alemã) estão apoiando a iniciativa. A meta é levar cerca de 45 produtores, sendo 23 instalados no estande do Sebrae, onde acontecerão rodadas de negócios com empresários alemães.
De acordo com dados da AECO (Associação das Empresas Comercializadoras de Orgânicos), por ano, o mercado brasileiro movimenta em torno de US$ 250 milhões com produção orgânica, sendo US$ 5 milhões só com exportação. Segundo a AECO, essa alta se deve em função da exportação de produtos como o açúcar, a soja e o café. O mercado de orgânicos brasileiro representa apenas 10% de tudo que é comercializado mundialmente, ou seja, US$ 30 bilhões.
A perspectiva de novas exportações para um dos principais parceiros comerciais do Brasil anima o setor. “A maior dificuldade desse mercado, no entanto, é a qualificação para que um produto seja orgânico. Nem sempre o produtor brasileiro está a par dos requisitos necessários para que sua safra seja certificada”, explica Dinah.
Biofach 2003 - A Biofach 2003 reuniu mais de 1,9 mil expositores vindos de 57 países. Isso representou um crescimento de 3% no índice de expositores, 12% em relação ao tamanho e 6% de visitantes circulando na feira. O Brasil dobrou o número de projetos - 40 em 2003 contra 20 na edição anterior. O estande conjunto ganhou força e ocupou 250 metros quadrados, um crescimento de mais de 100%. A expectativa para 2004 é manter a participação de 2003 e avaliar a possibilidade de ampliação do estande conjunto, uma vez que a procura de produtores nacionais aumenta a cada mês.
Mercado - Na América Latina, segundo o pesquisador Moacir Darolt, do Instituto Agronômico do Paraná (IAPA/PR), os países que apresentam as maiores áreas agrícolas tanto para produção animal quanto para vegetal orgânica são Argentina, Uruguai e Brasil. Desde 2002, o Chile teve um salto importante na superfície dedicada a agricultura orgânica, em torno de 600 mil hectares, basicamente pela certificação de áreas de pastagens.
Quanto ao Brasil, estima-se que, em 2002, o mercado brasileiro de orgânicos tenha faturado em torno de US$ 250 milhões, um acréscimo de 100% sobre o ano anterior. As exportações são o alvo principal, considerando que o mercado interno absorveu menos de 15% deste montante.
Dados do Centro Internacional de Comércio (ITC) mostram que o mercado mundial de orgânicos cresce a taxa média de 22,5% ao ano e as estimativas apontam vendas globais de US$ 25 bilhões em 2005.
Agência Sebrae de Notícias
Neusa Rodrigues: (61) 9285-7019 / (61) 348-7494
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