Estudos contam com a participação de pesquisadores das universidades federais de Viçosa e do Ceará
Há aproximadamente um ano, pesquisadores da Embrapa, da Universidade Federal de Viçosa e da Universidade Federal do Ceará montaram um colegiado para desenvolver uma variedade de feijão geneticamente modificada resistente à seca, dando prosseguimento a estudos de tolerância à seca iniciados há cinco anos pela Universidade Federal de Viçosa.
O objetivo dos pesquisadores é o de oferecer aos pequenos e médios produtores da região do semi-árido Nordestino uma opção de cultivo com produtividade, mesmo em condições climáticas adversas. De acordo com o pesquisador Eduardo Romano, da Embrapa, o feijão resistente à seca será uma alternativa de renda para o produtor nordestino. “Com essa variedade, o agricultor que utiliza o feijão como cultura de subsistência, poderá ter uma oferta maior de alimentos durante os períodos de seca. Nas regiões irrigadas, o produtor poderá gerenciar de maneira mais racional o uso dos recursos hídricos, economizando custos”, afirma Romano. “Os sistemas de irrigação são caros e o feijão resistente à seca permitirá o uso de menos recursos hídricos e irrigações em períodos mais espaçados”, completa.
O Brasil é o maior produtor de feijão no mundo. Segundo estimativas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a safra brasileira de feijão em 2003 deve ultrapassar a marca de 3,2 milhões de toneladas de grãos, equivalente a mais de 20% da produção mundial de feijão.
Alimento básico para a população brasileira, o feijão é a principal fonte de proteína vegetal das famílias, sendo que seu consumo anual per capta é de 14 quilogramas. O teor de proteína das sementes varia de 20% a 33%, sendo também um alimento energético, contendo cerca de 340 calorias a cada 100 gramas. No Brasil, o feijão é produzido basicamente por pequenos produtores: aproximadamente 80% da produção e da área cultivada encontram-se em propriedades menores que 100 hectares.
Liga / desliga
Na primeira etapa da pesquisa, os cientistas introduziram um gene de soja resistente à seca – já conhecido pelas suas propriedades de tolerância ao estresse hídrico – na planta do tabaco, comumente utilizada como piloto em pesquisas com transgenia. O tabaco mostrou-se capaz de ficar de 4 a 5 semanas sem receber água.
“Uma das propriedades da transgenia é que o gene que expressa determinada característica pode ser introduzido em diferentes espécies de plantas, sem alterar suas particularidades”, explica Romano.
Demonstrada a eficácia na planta do tabaco, os pesquisadores partiram para a segunda etapa do estudo, com a introdução do gene no feijão. “No momento, estamos isolando a seqüência do DNA que controla a expressão do gene de resistência à seca, para que ele seja ‘acionado’ apenas quando não houver água em quantidade suficiente”, conta o pesquisador. “O feijão poderá ‘ligar’ ou ‘desligar’ o gene, de acordo com a oferta de recursos hídricos”, explica.
Os genes que conferem resistência à seca também estão sendo introduzidos em soja para o desenvolvimento de soja tolerante ao estresse hídrico e, dessa forma, beneficiar os agricultores do Centro-Oeste, que na época do veranico, enfrentam problemas com a produtividade de suas lavouras. “Os produtores vão conseguir passar pela fase mais seca do ano, mantendo sua produção”, explica Romano.
Desperdício
O pesquisador prevê problemas para a fase de estudos em campo, já que estes dependem de licenças ambientais emitidas pelo IBAMA.
A falta de licença ambiental é uma ameaça ao trabalho dos pesquisadores, que corre o sério risco de ser paralisado. Isso aconteceu com as pesquisas para o desenvolvimento da batata resistente a vírus e do feijão resistente à praga do mosaico dourado, ambas suspensas e aguardando licenças para estudos em campo.
A Embrapa e as universidades públicas são centros de excelência em pesquisas com produtos geneticamente modificados no Brasil. Apenas a Embrapa desenvolve 11 variedades de soja transgênica, além de estudos com batata, mamão, cana-de-açúcar, milho e trigo. Quase todas as pesquisas são realizadas em parceria com universidades federais ou estaduais.
“A burocracia que os pesquisadores encontram agora para conseguir dar continuidade aos estudos, saindo dos laboratórios e passando para o campo, significa um desperdício de talento e de dinheiro público”, argumenta Romano. “Muitas vezes é dinheiro jogado fora, pois alguns projetos contam com recursos e não podem ser finalizados”, diz o cientista.
Em dezembro de 2003, Romano e mais de 300 cientistas estiveram em Brasília para conversar com os parlamentares sobre as agruras enfrentadas pela ciência no Brasil. “Pedimos aos deputados federais que alterem o PL 2401/03 (que regulamenta e lei de biossegurança no Brasil) para que as pesquisas no País não fiquem inviabilizadas como estão agora”, afirma Romano.
Os cientistas pedem que seja fortalecido o papel da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) como órgão responsável pela liberação de pesquisas com organismos geneticamente modificados no Brasil. “Queremos que sejam reconhecidos como conclusivos os pareceres emitidos pela comissão, formada por cientistas com competência para avaliar tecnicamente se o estudo pode ser realizado ou não”, explica o pesquisador da Embrapa. “Não pode haver burocracia para pesquisas”, completa.
No caso do feijão resistente à seca, além da licença, faltam recursos específicos para o projeto. O trabalho está sendo realizado com sobras de recursos e equipamentos de outros estudos. “Estamos em busca de investimentos direcionados para essa pesquisa ”, diz Romano.
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